Areia Branca tem a quarta maior taxa de óbitos por Covid-19 do país
Com
27,7 mil habitantes, Areia Branca, no Oeste potiguar, é o município com maior
taxa de óbitos por Covid-19 na região Nordeste. Foram 49 óbitos, desde o início
da pandemia, o que resulta em um índice de 176,4 mortes por 100 mil habitantes.
Segundo levantamento G1, com base nos dados do
Ministério da Saúde, a cidade está em
quarto lugar, entre todos as cidades do Brasil. Em média, o país tem 47 mortes
por 100 mil habitantes.
Embora
não apontem uma causa específica para a alta incidência de mortes, as
autoridades de saúde do estado convergem para uma possível explicação para o
alto nível de contaminação: atividades econômicas do município que foram
consideradas essenciais, não pararam, e atraem pessoas de várias partes do
país.
Além
de ter a maior mortes por Covid-19 no estado, município conta com uma das
maiores taxas de incidência potiguares, com 2534,7 casos da doença por 100 mil
habitantes. Apesar disso, ainda está atrás de cidades potiguares como Apodi
(3732,7), Jardim de Piranhas (2594,9) e Vila Flor (2555,2).
Veja
ranking de cidades com maior incidência de óbitos por Covid-19 por 100 mil
habitantes
Charrua
- RS - 213
Gastão
Vidigal - SP - 208
Pimenteiras
do Oeste - RO - 184
Areia
Branca - RN - 176
Anhanguera
- GO - 174
Jacareacanga
- PA - 170
Nova
Castilho - SP - 158
Guajará-Mirim
- RO - 156
Saldanha
Marinho - RS - 151
Porto
Espiridião - MT - 150
Entre
as 10 cidades com maiores taxas de óbitos do país, Areia Branca é a segunda
mais populosa, atrás apenas de Guajará-Mirim, que tem 46,1 mil habitantes e
está na oitava posição. A primeira colocada na lista, por exemplo, a gaucha
Charrua, tem pouco mais de 3 mil habitantes e registrou 7 óbitos.
Sal,
pesca, energias renováveis
Areia
Branca é famosa por atividades como pesca, produção de energias renováveis e
pelo setor salineiro - contanto com um porto-ilha usado para exportação de sal.
De acordo com a Companhia Docas do Rio Grande do Norte (Codern), que administra
o terminal, 51 trabalhadores do porto foram diagnosticado desde o início da
pandemia, apesar das medidas de sanidade estabelecidas.
"Essas
atividades são consideradas essenciais e não pararam. Antes da pandemia, a
gente não tinha ideia de onde vinham as pessoas que trabalham nessas
indústrias, mas agora sabemos que são de muitas cidades do estado, mas também
da Paraíba, do Ceará, de Pernambuco, de vários estados", afirma Ivanoska
Vale, enfermeira, responsável pelo setor de epidemiologia do município.
O
secretário de Saúde de Areia Branca, Alexandre Inácio, afirmou que o município
realizou parcerias com a Anvisa e a Vigilância Sanitária do Estado para
monitorar e orientar essas atividades econômicas e afirmou que as empresas têm
buscado cumprir todas as determinações do poder público.
"Nós
temos parques eólicos em construção, com grande fluxo de pessoas, mais de cinco
grandes salinas com grande contingente de pessoas, com fluxo alto de
caminhoneiros. Inclusive um dos primeiros casos aqui foi de um caminhoneiro que
veio do Ceará e contaminou várias pessoas em uma salina. O segundo caso
registrado no município foi de um mecânico que veio fazer manutenção em um
barco que deu positivado", afirma.
De
acordo com a Codern, que administra o porto-ilha, desde janeiro é executado um
plano de ação de prevenção, com disponibilização de equipamentos de proteção
individual aos colaboradores. Também foi implantado teletrabalho aos
funcionários acima de 60 anos ou com comorbidades; realização de desinfecção do
Terminal Salineiro de Areia Branca por Militares das Forças Armadas; escala de
14 dias de trabalho por 14 dias de descanso, em acordo com sindicato dos
trabalhadores portuários, e testagem antes de cada embarque.
A
secretaria municipal também registrava até a última terça (4) pelo menos 33
funcionários de empresas empresas salineiras diagnosticados com a doença e 10
de energias eólicas, mas o setor de epidemiologia considerou que o número pode
estar bem abaixo da realidade, porque muitas vezes o local de trabalho do paciente
não é informado no cadastro.
A
Secretaria Estadual de Saúde informou que, entre as ações realizadas no
município, houve inspeções e orientações nas salinas e uma operação que
resultou na assinatura de um termo de responsabilidade, por parte de uma das
indústrias, se comprometendo a cumprir normas de enfrentamento ao coronavírus.
Também foram feitas atividades de orientações com o setor de pesca.
Testagem
O
secretário municipal considera que outro possível motivo para o alto número de
infectados seria a quantidade de testes realizados por Areia Branca. "Aqui
no nosso município, a gente testa muito. Após uma parceria com o Instituto de
Medicina Tropical, passamos a ter cerca de 30 testes por dia, por isso o alto
número de confirmados. Ah vários municípios que tiveram alto índice do
coronavírus, mas não testaram. Houve sub-notificação, não tenho medo de dizer.
Aqui não, cada caso de síndrome gripal foi notificado. Por isso, a gente está
sendo bombardeado", afirmou.
Alexandre
Inácio ainda declara que o município também combateu o coronavírus com
realização de barreiras sanitárias, enrijecimento de medidas para garantir
isolamento social, com proibição de uso das praias, por exemplo, e adotou o
medicamento Ivermectina - remédio ainda sem comprovação científica de eficácia
contra a doença - no tratamento dos pacientes.
Por
outro lado, a subcoordenadora de Vigilância Epidemiológica da Secretaria
Estadual de Saúde, Alessandra Lucchesi afirma que, embora o município esteja
entre os oito que mais realizaram testagem no estado, isso não justificaria o
alto índice de infecções ou mortes.
"Areia
Branca aparece dentro da lista dos município com maior proporção de testagem
por habitante, mas isso não justifica o grande número de casos. Apodi é o que
mais testa, mas não está entre os primeiros na mortalidade. E a proporção de
positividade (em Areia Branca) é muita alta. Cerca de 43% dos testes têm
resultado positivo. Isso nos mostra que há uma grande circulação do vírus em
si. Não está relacionada à capacidade de testagem do município", diz.
Alessandra
reforça que o município teve um início de pandemia com "característica
muito específica, que foi a contaminação no porto-ilha". Além disso, houve
relatos de descumprimento de isolamento domiciliar, por parte de pessoas infectadas
e a existência de um alto fluxo de pessoas da região Oeste do estado no
município.
Municípios
em que foram realizados mais testes para COVID-19 no RN
Apodi
- 83,4 a cada 1000hab.
Timbaúba
dos Batistas - 80 a cada 1000hab.
Caraubas
- 69,7 a cada 1000 hab.
Vila
Flor - 63,7 a cada 1000 hab.
Natal
- 55,8 a cada 1000 hab.
Guamaré
- 55 a cada 1000 hab.
Jaçanã
- 54,3 a cada 1000 hab.
Areia
Branca - 54 a cada 1000 hab.
Isolamento
social
Durante
a pandemia, Areia Branca realizou
'lockdown', com fechamento de acessos à cidade e barreiras sanitárias,
como outros municípios do estado. O Ministério Público informou que acompanha a
situação do município e que o promotor que atua na região foi informado durante
uma reunião, de que o motivo para os altos índices locais seria a baixa adesão
ao isolamento social, que seria menor que a média estadual. No mesmo encontro,
o promotor orientou o comandante da Polícia Militar no município a prestar
apoio às operações de fiscalização do município.
Mas
dados do próprio Ministério Público contradizem a relação entre o isolamento
social e as taxas municipais. Números solicitados pelo G1 ao sistema
"Tô de Olho", lançado pelo MP para acompanhar a pandemia no estado,
apontam que o município apresentou índices superiores à média estadual nos dois
primeiros meses de isolamento, e ficou muito próximo da média estadual em junho
e julho.